O fenómeno da violência doméstica tem vindo, a pulso, a ganhar visibilidade na nossa sociedade e a ser encarado como o problema social que é.O primeiro passo foi a ultrapassagem do foro do domínio privado.Para ser rigorosa devo dizer: mais do que privado, considerado quase sagrado e inviolável, em que a casa de um homem era o seu castelo e em que a castelã era coisa menor, mais um objecto do proprietário.
Recordo factos da minha infância em que a posse se estendia não só à cônjuge mas às outras mulheres da família – irmãs e mãe – se estas tivessem o “azar” de enviuvarem ou de ficar solteiras, e que se expressava através das mais abjectas formas de dominação e exploração que possamos imaginar as quais, sendo socialmente aceites, eram recobertas com um manto de silêncio.
Era frequente mulheres solteiras nunca virem a casar porque, a cargo dos irmãos, estes as mantinham em clausura, dentro das próprias casas, não saindo, não convivendo, não tendo hipótese de verem serem vistas, conhecerem e serem conhecidas.De casos mais extremos soube em que, com cumplicidades várias foram asiladas como loucas.
E falo de situações de que tive conhecimento ainda não há meia centena de anos atrás. Estas mulheres não detinham quaisquer direitos e, socialmente, um enorme manto de hipocrisia, em nome dos bons costumes, recobria todas estas acções.
A razão de ser prendia-se com factores de ganância. Não casando elas os bens continuavam a ser administrados pelos irmãos, que nunca prestavam contas e que, mais cedo ou mais tarde, acabavam por os anexar ao seu património.Esta a violência que desde muito criança apercebi no meio da burguesia.
A outra, a dos “pobrezinhos”, essa tinha expressões mais físicas.Entre uma e outra venha o diabo e escolha.A cultura recobre todos estes aspectos e há sempre um ditado popular adequado a cada situação e momento. Até ao ponto de baralhar e fazer confundir, afecto com violência: “ se lhe bate é porque gosta dela”.
Até as mulheres interiorizaram estas mentiras. Era fácil. Tem sido fácil.Foi difícil passar-se a considerar o crime de violência doméstica/ familiar como crime quando à luz do código penal sempre foi crime agredir terceiros.Com resistências e com a influência das políticas da U.E Portugal teve que se passar a considerar a violência doméstica como um crime de natureza pública.As relações entre homens e mulheres mudaram a uma velocidade astronómica, em Portugal, considerando o terreno que havia a recuperar.As e os jovens de hoje foram criadas (os) dentro de modelos de convivência, de igualdade e de respeito que nos levam a pensar que muito caminho se desbravou e que a conquista, no campo dos direitos entre géneros seria um espaço, suficientemente claro para cada um se posicionar sem pisar o outro género.
Há um par de anos houve um surto de homicídios, muito destacados nos noticiários televisivos. Numa dessas situações, a repórter de serviço, frente à casa onde o marido tinha morto a mulher a tiro, circulava inquirindo os vizinhos. Eis que ouvi, da boca dessa jovem, esta pergunta:“ O que é que ela (a vítima) fez ao marido?”
2 comentários:
Bem aproveito este k tá vazio (ate agora) hehe pa deixar aki publicamente as minhas desculpas pela minha ausencia :P
besu besu ****
Lana, não é caso para desculpas. ó k se sente a falta. Sabes k sim. Bjs e :))
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