28 janeiro 2005

As Tágides



Traziam, outrora, as tágides,
inspiração aos poetas,
brilho de fósforo aos olhos das mulheres,
sal saturado de vento aos barcos na espuma,
a música do canto à gente ribeirinha,
sumida de saudade,
espavorida de dores.
Traziam, outrora, as tágides,
as marés, o mar e a lua,
o rolo das vagas,
as insónias lentas nas noites
em que o verão incendiava
ou a prateada chuva forjava, nas vielas,
fantasmas futuros do fado.
O rio corria azul (ou seria verde?)
As casas nasciam da pedra (ou seriam de água?)
A fala dos homens confundia-se
com o rocegar das gaivotas (ou seriam nuvens?).
Nos becos, os muros dividiam as colinas
e, com a sua lentidão,
as cores iam formando a substância das árvores
e eram os perfumes do ar
o sabor de aventuras ou dos metais,
o equilíbrio das vozes, rápidas e densas
que, dentro das casas,
amavam, choravam e transformavam o fogo e a pedra,
a cal e a mansa madeira,
o cereal em pão, a fuligem em barro,
o zinco em lâmina, as lágrimas em fulgor,
o linho em eternidade.
Seria Lisboa essa cidade de tágides e ninfas
na imaginação do sonho?
Seria Lisboa essa cidade fábrica de rumores,
de cheiros, de claridade branca?
Seria Lisboa, sobre lo mar,
a que barcas novas mandava lavrar?
Seria Lisboa essa memória da emoção das gentes
com o marulhar das águas ...
... ou será Lisboa esta efémera hora matinal
em que a maresia morre
no volume que as pedras erguem,
na bruma dos fumos sem luz,
no choro aflito de uma criança
frágil como um vidro,
na escuridão dos jardins,
nas rugas velhas das águas do rio,
no definhar das árvores,
na vozearia do insustentável peso dos odores,
no coração ausente ou no tropel dos ruídos?
Que trazem hoje as tágides aos sinos inaudíveis,
aos gatos errantes,
aos cais de restos,
às ruas de chão brusco,
às estátuas cínzeas?
Fiéis à sua cidade amada,
trazem as tágides a Lisboa a carícia fulgurante
da sua inexplicável luz.
Loura é Lisboa quando a primavera explode.


Este capítulo faz parte integrante da obra de Orlando Neves "Odes a Lisboa"


(Uma Tágide) Venus por C Burne-Jones
TMara

6 comentários:

Anónimo disse...

tenho de ir embora..mas como eu sou maluca e vou chegar atrasada...xarãmmmmmmmmmmm oh pa eu aki em 1º e tudo lool va xauuuuuuuuu

/me começa a correr

***

SalsolaKali disse...

Talvez seja Lisboa, em que a maresia VIVE
no volume que as pedras erguem, na bruma DA LUZ SEM fumos, no SORRISO TRANQUILO de uma criança frágil como um vidro, na LUMINOSIDADE dos jardins, nas rugas DO TEMPO das águas do rio, no MULTIPLICAR das árvores, na vozearia DA insustentável LEVEZA DOS SABORES E ODORES, no coração SEMPRE PRESENTE ou no tropel DO SILENCIO...
Há sempre uma qualquer magia em Lisboa de manhã...
BJ
SK

Anónimo disse...

Ai as Tagides... k fonte de inspiração :-) Bom fim de semana! Jokas! o rapaz que pensava que o mundo era redondo

Conceição Paulino disse...

Lanita ;) ôi, maluquice boa...Xarãããã...chegaste a horas, n/ chegaste? Bjs e ;)

Conceição Paulino disse...

Salsolakali - k texto lindo:) O Orlando iria gostar desse sentir,dessa respiração da cidade vibrando em ti. Eu gostei. Bjs e ;)

Conceição Paulino disse...

Cacau - as Tágides se habitam no rio nada seriam sem o fascínio dda cidade. O todo é k as faz importantes e inspiradoras. Talvez respiremos as brumas da respiração delas..Bjs e ;)