22 outubro 2005

Nostalgia (parte 2)


Sabes..., olhou-me mais insistentemente tocando-me as mãos..., dentro de mim, tomando forma e soltando-se. Um grito de alerta e desejo.
O desejo por uns olhos que ao olharem-me sorrissem sempre, incondicionalmente, só porque me viam e eram retribuídos com idêntico olhar. Expressando muita alegria e contentamento por existirmos e nos termos encontrado...


Um silêncio caiu entre nós. Pensei em falar, mas olhando Maria Clara, vendo uma dor funda espelhada no olhar, calei e limitei-me a deixar cair um lacónico: sim!
Foi uma pausa prolongada em que cada uma caiu nas suas recordações, atentas no entanto.

-
Mas houve um temporal, ciclone, tufão, tromba de água, espiral de loucura, que tudo arrasou.
O que era perfeito estilhaçou-se. Tentámos, penso que sim, olhou-me como quem busca anuimento, mas dele não necessitando, penso que cada um de nós tentou, a seu modo, apanhar os milhões de fragmentos e restaurar, recuperar, reconstruir...
Só que depois do temporal, vendaval, maremoto, tsunami, já não éramos os mesmos...

Com as mãos ansiosas, mas deserdadas de olhares de ternura, de afagos, tentámos a reconstrução. Tentámos e falhámos. Durante anos tentámos....até ao limite! Tu sabes!
Até ao ponto em que cada um de nós se tornou, interiormente, um vulcão, vivo, dorido, agitado, onde se moviam magmas sem escape, e cada vez mais nos apartavam e feriam mutuamente.
Inexoravelmente, já não dois seres amantes mas ilhas, vulcões doridos com as entranhas a arder, a alma eruptiva, magoada e distante, sempre mais e mais distantes do universo de perfeito equilíbrio que era o nosso, que construíramos e habitáramos.
Continuou,... um tempo de loucura e dor, lembras-te?
Agora foi-se. Tudo se foi menos a memória de um amor-mais-que-perfeito que um dia, como tudo o que é perfeito e o mundo não consente, se estilhaçou, murchou, morreu...

(continua)

Hoje

passa o aniversário de nascimento de meu pai que partiu há décadas.

Estejas onde estiveres, estarás sempre no meu coração.

Obrigada por tudo, pai.

POST SCRIPTUM - O Art Of Love chamou-me, e muito bem, a atenção para o facto de estar adiantada no tempo. De facto acelerei os dias, sem me aperceber. Postei a 21, pensando ser 22. Assim fica então, pois que no meu coração era já, 22 de Outubro.

15 comentários:

Å®t Øf £övë disse...

TMara,
nem imaginas como me identifiquei, e como me tocou esta tua "Nostalgia".
As coisas são mesmo assim como descreves. Chega a um ponto que fica dificil superar determinadas situações.
Bjs.

PS:. O teu post não está adiantado no tempo???
Sabado dia 22!!!

aDesenhar disse...

bela e sentida homenagem...

bjs.

Anónimo disse...

Um beijo solidário.

Anónimo disse...

Esse conto,de que fui ler a primeira parte, espelha a exacta realidade do evoluir das relações. É isso mesmo. Nós bem queremos que seja perfeito, sempre. Mas não é.
Prestas ao teu pai uma bonita homenagem que eu entendo bem, dado que já perdi o meu há 13 anos.
Beijinhos

gato_escaldado disse...

gostei muito do texto. deixo-te um beijo solidário

Anónimo disse...

Bonito este blog. Bela homenagem ao seu pai, infelizmente no passado dia 12 também tive de fazer o mesmo, muito triste. Mas o que nos vale é que eles estão sempre do nosso lado.
www.ofeliazinha.weblog.com.pt

Anónimo disse...

Bonito este blog. Bela homenagem ao seu pai, infelizmente no passado dia 12 também tive de fazer o mesmo, muito triste. Mas o que nos vale é que eles estão sempre do nosso lado.
www.ofeliazinha.weblog.com.pt

maresia_mar disse...

Olá Tmara,
tal como prometido cá estou eu a ler a continuação do teu conto. Lindo e triste ao mesmo tempo, mas infelizmente é assim que terminam muitas relações, e enfrentar essas situações é muito doloroso.
Quanto ao facto do teu pai ter partido, eu sei o que é sentir saudade pois o meu já se «despediu» há 5 anos.. Bom fds

LUIS MILHANO (Lumife) disse...

Sentida homenagem.

Bom fim de semana

Bjs

Poesia Portuguesa disse...

"...Tudo se foi menos a memória de um amor-mais-que-perfeito que um dia, como tudo o que é perfeito e o mundo não consente, se estilhaçou, murchou, morreu..."

... mas permanece viva dentro do coração!

Gostei muito de ler-te... é como ler a minha alma...

Um abraço e bom fim de semana ;)

Zica Cabral disse...

a ideia de uma "amor-mais-que-perfeito" é talvez uma utupia das mais crueis que se inventaram......
Não há amores perfeitos, só as flores. O amor, na minha opinião, é feito das mil imperfeições que cada um dosamantes tem. Que se aceitam, se respeitam, se consentem. A paixão, pelo contrario, é toda feita de perfeições inexistentes. Consome-se na perfeição e, quando as imperfeições aparecem esvai-se como um cigarro feito em cinza.
O amor resiste, cresce, amadurece, transforma-se todos os dias.
A paixão enlouquece-nos e, quando se vai embora, deixa-nos um amargo vazio e consente em que maguemos o outro. O amor, que é feito de respeito e amizade faz com que tenhamos o cuidado de nunca maguar.
Esta é a minha opinião pessoal que não "impinjo" a ninguem mas que é fruto da minha propria experiencia.

Estou a gostar muito deste conto e espero ler mais em breve.
bjs grandes
Zica

isa xana disse...

tenho medo de como me sentirei quando algum dos meus pais morrer

bom fim-de-semana
beijo

mfc disse...

O meu partiu no ano passado e ainda o sinto aqui... uma falta que me dói imenso.
Um grande abraço de compreensão e muita ternura.

Anónimo disse...

Desta segunda parte do texto "Nostalgia", saliento esta parte "...Com as mãos ansiosas, mas deserdadas de olhares de ternura, de afagos, tentámos a reconstrução. Tentámos e falhámos. Durante anos tentámos....até ao limite!...". Fico aguardar a continuação do texto. Beijinhos.

Daniel Aladiah disse...

Querida TMara
Por aqui, lendo-te a nostalgia...
Um beijo
Daniel