NO CINTILAR DOS DIAS
Ou, a partir de hoje:
“A ESTRANHEZA DOS DIAS” – (2003.04.01)
DA ESTRANHEZA I _Os dias sucedem-se, matematicamente organizados, em semanas, meses e anos.
As estações, com algumas alterações que as fazem parecer mais estranhas do que as de há umas dezenas de anos, continuam a suceder-se trazendo-nos as belezas próprias de cada uma e o maravilhamento do mundo.
No entanto, se olharmos atentamente, descobrimos, ou pensamos fazê-lo, que há uma “estranheza” nesta regularidade que nos dá confiança e segurança anulando espaços de imponderabilidade e levando-nos a pensar que a vida é um rio que flúi, com os seus acontecimentos, uns menos bons do que outros, mas que flúi numa sucessão de vida e de vidas de que a morte é só uma componente, embora dolorosa .
A mudança de nome destas crónicas tem a ver com esta estranheza total que a vida comporta e que tendemos a esquecer, acomodados nos nossos quotidianos, apesar das violências várias que grassam no seio das sociedades em geral e, particularmente em momentos de muita dor e sofrimento para milhões de seres tão humanos e tão iguais a nós, na essência, como se de nós mesmos se tratasse, em zonas localizadas desta “bola” azul que navega, na imponderabilidade do cosmo e do caos criador.
A violência, seja qual for a forma sob que emerge é, para mim, um motivo de grande, absoluta e total estranheza que me leva a, cada dia, repensar a minha visão do mundo e dos seres estranhos que o habitam e que se intitulam a si próprios “humanos” e se crêem reis desse mundo que os gera, acolhe, alimenta e sustêm, em todos os planos e aspectos.
DA ESTRANHEZA II _ O foro privado da vida das pessoas, sob muitos aspectos, tornou-se público. Entramos no quotidiano das pessoas e nos seus conflitos ou afectos, sem a eles sermos chamados e contra vontade. Para tal contribuem: por um lado o uso dos telemóveis nas ruas, transportes públicos, cafés e restaurantes, jardins e praças, enfim, em todos os locais que são considerados “públicos” porque comuns. Por outro lado o limiar do contacto físico e de expressões de afecto elevou-se a uma fasquia alta, dada a abertura verificada. E, no entanto, a estranheza assaltou-me quando vi um gesto simples, mas embebido de um carinho, de uma profundidade incomuns, entre duas pessoas idosas. Mais do que o toque das mãos, mais do que o afagar do rosto foi a densidade dos gestos, o cuidado e uma solenidade quase mágica (ou religiosa) e a qualidade do olhar que os acompanhava.
E no meio de mais uma guerra, tão explicada, mas afinal tão mal justificada, a estranheza dos dias, a estranheza dos nosso quotidianos e a estranheza dos nossos gestos tomou-me de assalto, assim começando a Primavera de 2003. Olhemos então, com olhos de ver, A ESTRANHEZA DOS DIAS como um instrumento de análise para a compreensão de nós no mundo.
6 comentários:
obrigado pela visita :)
vim conheçer o teu cantinho e encontro um lugar de agradáveis reflexões :)
é correcta a análise que fazes do mundo que nos rodeia :)
concordo contigo :)
voltarei à tua biblioteca :)
:))
Querida TMara
Gosto do template :)
A violência sempre fez parte da vida dos humanos... a nossa civilização é que está a procurar resolver essa questão, mas não deixamos de ser humanos, logo seres que têm medo da diferença, logo que reagem com agressividade.
Só a educação nos poderá levar a outro patamar de relacionamento, mas isso demorará muitos anos ainda.
um beijo
Daniel
Esta é uma reflexão intrigante.
O tempo...já alguém definiu o tempo? Ele é complexo... sabemos que flui, mas nada sabemos dos seus primórdios nem da sua finitude...
É um enigma.
Pois, é um tempo estranho, de facto: por um lado, temos uns braços que nos levam a outros planetas, por outro, a «densidade de um gesto», como dizes, parece constituir uma excepção e não a norma. Mas talvez seja isso que nos é dado «a ver» e haja muito mais «gestos densos» do que imaginamos, e isso, ESTRANHAMENTE, não é notícia.
Bjo
muito estranhos os dias de hoje... mas suponho que em todas as épocas as pessoas estranhavam os seus dias. faz parte da condição humana.
beijinhos
Fomos educados a correlacionar tempo e espaço como referenciais superlativos. Por ter sido introduzida velocidade ao nosso quotidiano a noção estável(?) de espaço foi abalada. Abrandar talvez nos garanta pouco; o espaço desponível talvez já não preserve memória... (É aceitável isto?)...Sentimo-nos desconfortáveis,não é!
Bjs
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