16 fevereiro 2005

A mulher continua a habitar


O calendário indica que o ano
se está a esgotar.


A mulher continua a habitar

a casa. A circular por ela.

A limpá-la, a abrir as janelas

para que o ar e o sol

a penetrem.

Senta-se, por vezes, ao sol,

nas varandas da casa.

Pega nos livros e lê.

Às vezes perde-se nos pensamentos.

Esquecidos os livros

nas mãos distraídas.

Descobriu, hoje, que o ano está

a chegar ao fim.

Uma certa estranheza invadiu-a.

Não se lembra do passar dos meses...,

não lembra quando foi à rua

pela última vez....Há já muito

tempo que não sai dos limites

da casa.

Lembrou-se ainda que o telefone

nunca toca. Nunca ninguém

telefona,

a saber dela, para falar com ela....

Em verdade também não

se tem lembrado de ligar

a ninguém....

Persiste-lhe a estranheza. Se

o ano se está a esgotar, se

se levanta, come, bebe, dorme

e habita dentro da casa, como é

possível fazê-lo durante tanto tempo

sem nunca sair à rua?

Sem que os amigos estranhem a sua

ausência e telefonem?

Não sabe explicar a estranha

situação.

Serena levanta-se da cadeira

que ocupa à secretária e vai sentar-se

na varanda, ao sol.

Sente frio.

Só se sente bem ao sol.

Habita a casa onde viveu, a mulher.

Desconhece que morreu.

Por TMara, do livro: FALAR MULHER:48-49

10 comentários:

Anónimo disse...

Bonito..gostei :)quando li a principio li "o calendario indica k o amor se está a esgotar"e depois de ler o texto pensei..."k lindo...ela morreu os dias acabram...ja n passam..mas é mm só no calendário k o amor se está a esgotar..e ela continua ali pk continua a amá-lo." depois fui ler outra vez...e vim comentar..vi o titulo bem e pensei" mas como é k eu li ali amor???" e gostei do texto...mas ainda bem k li mal pk gostei tanto desta interpretaçao k fiz...enfim :) **

Conceição Paulino disse...

Lanita :) há vários tipos de morte.....A tua interpretação, partindo de uma construção fásica já interpretativa, não perde validade.
Bjs e :)

Fata Morgana disse...

Bonito, lindo! Morrer é tantas coisas... Fico a pensar qual das mortes passou sem que ela notasse!

Vim ler-te, TMara. Tinha saudades e hoje, caramba, hoje estou aqui por minha conta e ninguém me chateia, o tempo é meu :)

Fui lendo e comentando, pelo blog abaixo.
Beijinhos e sorrisos!

Anónimo disse...

Um final triste, mas um contexto realista, mas do que muita gente pode imaginar... O fim não é a morte... porque, a solidão é uma verdade bem real no mundo de hoje. Eu sei.
Jinhos. Gostei muito de te ler.:-)

Conceição Paulino disse...

fatamorgana :9 foi bom ter-te cá por casa. Já sabes, portas n/ há, as janelas estão sempre abertas e de um lado dão para a charneca, e do outro p/ o mar.
Quando quiseres és semprre bem vinda.Cheguei agora e vou ler por aí abaixo. Tens razão: há mtas mortes. Qual delas passou deixo a quem lê.K bom teres tido um tempo p/ a tua respiração, no teu tempo.Até já. Bjs e ;)

Conceição Paulino disse...

menina_marota:) estás tão certa quanrto às solidões. Tmb, como tu, conheço muitas situações. Coisas inimagináveis. K bom k vieste. Bjs e ;)

Nilson Barcelli disse...

O teu texto é fascinante.
Porque a todos nós há sempre alguma coisa para a qual já morremos. Ainda que a inversão seja possível.
Beijinhos e bfs.

Conceição Paulino disse...

Nilson - concordo contigo em absoluto.Mas, de facto, a reversão é possível, apesar de haver momentos em k julgamos k não. Bjs e ;)

Fátima Santos disse...

Texto espantoso ambiente forte e fantasmagórico, mas vivo rela! Um abraço!

Conceição Paulino disse...

Sela :) k bom k vieste e deixaste caminho. Bjs e ;)