03 janeiro 2006

Revisitando-me


Esta é a minha fala, esta sou eu que falo, esta é a voz que ouço (creio ser a minha) e que me diz de mim.
Quem sou, do que gosto, o que sonho, o que me magoa.
Esta é a voz que me fala da que sou, para além da visão que as outras pessoas possam ter de mim.
A que me fala de um secreto eu, meu e eu, somente por mim conhecido porque a voz me fala, e falando me constrói, porque, lembro de a minha mãe ler um livro bonito e ao mesmo tempo assustador em que dizia: “No princípio era o Verbo.”
E como esta frase sempre me encantou, me pareceu uma forma mágica um dia perguntei: “Mãe, o que quer dizer?”
Respondendo-me ela que se referia ao começo do mundo e da vida e que nesse começo, a palavra, que era o que verbo, queria dizer é que tinha o poder de fazer as coisas acontecerem (como o mágico fazia no circo, pensei eu e guardei esta ideia de belo e mágico através do poder da palavra e foi por isso que quando comecei a ouvir a voz, na minha cabeça, a ter longas conversas comigo não o disse a ninguém, guardei o segredo e a voz só para mim com medo de que o encantamento se quebrasse se o contasse a alguém e eu deixasse de ser real).
Duvidam?A minha avó Deolinda, mãe da minha mãe, contava-me muitas histórias do tempo das princesas, em que as fadas e as bruxas faziam acontecer coisas estranhas. Bem mais estranhas do que a de eu desaparecer se contasse aos outros da existência da voz e de a minha vida depender de ela continuar a falar comigo.

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