29 julho 2008
meu texto no 5º Jogo das 12 Palavras
surpresa na noite
Estávamos à conversa quando um imprevisto e subterrâneo movimento, mesmo por baixo de nossos pés, nos perturbou. O movimento, de intensidade variável, tornou-se inquietante. Calámo-nos. Sentíamo-lo cada vez mais intenso e um som como um rugido chegou-nos das entranhas da terra.
Algo temerosos afastámo-nos. O silêncio entre nós. Sem pestanejar fixávamos o ponto onde sentíramos o movimento.
A terra fendeu-se e um intenso jacto de fervente vapor, vertical coluna, queimou tudo ao redor num círculo de vários metros. Sem desviar os olhos batemos em retirada, ás arrecuas, mas não para fugir. A curiosidade superior ao espanto e ao receio. Encontrávamo-nos num estado de estupor
O luar, a inundar a clareira criada pela devastação dos arbustos e árvores calcinadas, dava-nos total visibilidade.
Por horas sem conta ficamos silenciosos a observar a vertical coluna a subir pelo nocturno céu enquanto aos poucos perdia intensidade, potência…tanto no calor que irradiava, como na altura a que se projectava.
No cimo de um inesperado e intenso jacto surgiu um imenso casulo.
Casulo foi a palavra que nos surgiu.
Semelhava o casulo do bicho-da-seda.
Mesmo à distância a que nos encontrávamos constatámos que teria uns dois metros e meio de comprimento por cerca de metro e meio, ou mais, de largura.
O jacto de vapor decresceu em intensidade e altura até pousar suavemente o casulo no solo.
A surpresa e a consternação eram gerais mas, aos poucos, face à quietude proveniente daquele imenso corpo aproximámo-nos do casulo depositado no calcinado solo, num movimento síncrono. Como um corpo único. Não se ouvia um ruído. Nem o passar do ar. Nada se movia ou ouvia. Na terra, a anterior e inesperada agitação parara. Sem olhar uns para os outros, a cerca de dois metros estacámos.
Os olhos sempre focados naquele enorme e desconhecido objecto iluminado pelo luar como artista em palco iluminado por holofotes. A lua parecia ter parado num ponto do céu. Num recanto do meu cérebro a racionalidade abriu caminho e ecoou: foi a terra que parou de girar para que a lua continuasse a iluminar o estranho casulo…
Eis que começou a irradiar uma luz amarelo-alaranjada viva contrastando com a branco-azulada da lua e, diante de sete perplexos pares de olhos, abriu-se ao meio, qual casca de noz, e um enorme ser alado, de humana forma, ergueu-se distendendo o alto corpo e as longas asas de uns quatro metros de envergadura. Foi então que nos viu e saudou-nos.
- “Saúdo-vos, humanos. Sou o Nefelibata Portugal e há 865 anos fui punido e enviado para as profundezas do planeta Terra. A punição foi tanto para mim como para vós, povo português, em virtude do violento acto de um filho contra sua mãe, por ambição em reinar. Nós, Nefelibatas, somos os mensageiros dos sonhos construtivos que alimentam a roda da vida de cada povo e do planeta. Vós sois o meu povo. O inferno em que tendes vivido acaba hoje porque o ostracismo que me foi imposto para punir a minha incúria ao não ter previsto a subversão do sonho deste país terminou. Voltareis a ser um país que sonha, age e faz acontecer. A vossa auto-estima é-vos devolvida e fareis grandes feitos. Coisas que até há pouco vos foram sonegadas - porque esse é o meu trabalho e estava impedido de o fazer – alimentar e reforçar o sonho construtivo e inovador…”
Dito isto o enorme ser alado abriu as asas e desapareceu nos ares. O luar, que sempre sobre ele estivera fixo, desapareceu de imediato. O tempo retomou a normalidade e vimos a lua no céu.
Muito à frente do local onde nos encontrávamos agora imerso num breu incomodativo e surpreendente.
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2 comentários:
Que sonho bom e belo, o teu texto.
E que imaginação prodigiosa, por aí à solta a transportar-nos para locais oníricos:))
Beijo
Pedindo antecipadas desculpas pela “invasão” e alguma usurpação de espaço, gostaríamos de deixar o convite para uma visita a este Espaço que irá agitar as águas da Passividade Portuguesa...
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