31 maio 2005

Epitáfio e informação

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PARA UM EPITÁFIO

Morreu,
despedaçou-se,eclipsou-se,
utilizou palavras,
comeu pão com manteiga,
gastou livros, telefones,
os santos de todos os altares.

Canonizou-se,
consumiu-se,
entre latidos, ondas,
tempestades de areia.


NAVARRO, António Rebordão (1988). 27 POEMAS. Porto: editora Justiça e Paz (21)


ESTÃO ABERTAS AS PORTAS


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de vossas casas e por elas me passeio.
Infelizmente em muitas não posso deixar pegadas visíveis

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porque os comentários JAVA (e já não sei se mais alguns), não abrem.

E são muitas as casas onde entro e prazeirosamente me espraio pelos recantos mais belos e harmoniosos, por onde paro nas tertúlias de ironia e mal-dizer, lendo e deliciando-me querendo, muitas vezes, dialogar um pouco, mas incapaz de o fazer.

Estou a tentar resolver o problema para voltarmos a um convívio mas directo.

30 maio 2005

(...) o riso é privilégio dos deuses e dos homens

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« (...)porque
o riso é o privilégio dos deuses e dos homens
originado na aurora dos tempos, do deus que se reconheceu ele próprio,
em muda intuição, originário da sua presciência,
da presciência da sua própria destrutibilidade,
da presciência da destrutibilidade e da criação, de que ele
é parte criada e criadora, e na qual se desenrola a sua existência,
crescendo graças ao conhecimento do mundo até ao
conhecimento de si próprio e até o ultrapassando
voltando-se para a presciência,
de onde provém o riso:
oh, nascimento dos deuses e nascimento dos homens, oh morte
dos deuses e morte dos homens,
oh, começo e fim de ambos para sempre entrelaçados,
oh, o riso tem origem na consciência da não-divindade dos deuses,
nessa consciência comum aos homens e aos deuses,
tem origem nessa zona inquieta, de uma inquietação transparente,
(...)
Deus e o homem se pudessem encontrar, se quisessem encontrar,
E se Zeus se ri no círculo dos deuses-machos,
Seus divinos companheiros,
Foi o homem que despertou o riso dos deuses,
tal como,
no círculo perpétuo do reconhecimento meio-sério, meio-brincahão,
o riso dos homens é despertado pela conduta do animal,
tal como,
o deus se encontra no homem, assim o homem se encontra no animal,
para que o animal se eleve a deus pelo homem,
e o deus volte ao homem através do animal,
deus e homem unidos na tristeza, se bem que vencidos pelo riso (...)»


BROCH, Hermann(1987) A MORTE DE VIRGÍLIO. Lisboa: Relógio d’Água. 1º Volume (140:141)

29 maio 2005

Para a Ana no seu aniversário

Para a Ana no seu aniversário


Esta é a minha
filhot´Ana

Passa hoje o seu aniversário. E já passaram tantos anos, desde que nasceu....
Ela, as irmãs e a neta são as melhores coisas que a vida me deu e por isso estou grata.

Mas hoje é dia de homenagear a Ana pela pessoa linda que é.
Bem hajas por teres cruzado o meu caminho filha.

O que te desejo? tu sabes!
Que a vida te seja mansa, mas acima de tudo que sempre saibas ultrapassar os obstáculos tornando-os em qualquer coisa mais e melhor do que pedras no caminho.
Que o teu segundo nome se concretize sempre em actos, pois foi essa a intenção quando to dei.
Que essa luz interior que irradias se fortaleça e sempre esteja contigo, para ti e para os outros. Neste dia em que físicamente estamos longe, mas sinto o teu coração bater em uníssono com o meu, lembro-te (como se fosse necessário...): nunca esqueças o quanto te amo desde que soube que estavas em mim, semente e promessa.
E sei que te amarei para além do tempo e da morte física.
Recebe um beijo grande de ternura, salpicado de brisa marinha num mar de chupa-chupa.

27 maio 2005

A minha rua é um rio

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A MINHA RUA É UM RIO

E lá volto ao tema da minha rua. A rua onde moro.

Lida de fora, por vocês, espero que compreendam não ser pieguice, mas prazer que a rua me dá compelindo-me a dela falar.

A minha rua corre de nascente para poente (e vice-versa).
Ontem foi feriado. Hoje continua um fim-de-semana prolongado alterando-lhe o aspecto, o movimento, a vivência.

Já vos falei dela, de como é uma rua (quase) de aldeia.
Ontem era uma rua silenciosa, mas um silêncio gostoso. Cheio de trinados de aves e gatos ronronando nos muros dos quintais, pontilhado, de onde em onde, por ladridos dialogando entre si.

Toda ela bordejada, nas margens, por carros adormecidos.
Estranhamente o silêncio tecido na rua, pela rua, era tão aconchegante que nem as “latas” abandonadas conseguiam romper a magia.

Por norma há qualquer coisa de ameaçador numa rua cheia de carros parados, sem pessoas dentro ou fora deles, ainda mais quando aguardamos um pouco esperando o usual movimento que não acontece. Ontem era assim: uma rua deserta, onde só a “lata” imperava. Mas nada de ameaçador havia.

No ar o sussurro da luz e de bandos de pequenos, quase invisíveis, insectos flutuando nos raios solares, em suspensão, em estranhas danças, davam-lhe um ar de encantamento. Sentia-se a magia.

Os carros, sem utilidade, jaziam brilhando ao sol. Estranhas carcaças inertes e silenciosas, falando de outros momentos, aguardando o chamado.

A luz do Sol, quando este nasce, irrompe pela rua como por portão acabado de abrir convidando a entrar.
Ao deslocar-se continua, por umas horas, a percorrê-la de forma total, sem sombra em qualquer das margens. Sim, das margens, pois é disso que se trata: a minha rua é um rio de sol, luz e calor, que se estende, desliza e corre, por onde se pode navegar como quem desliza.

E é isso que faço a cada manhã, tomando um refrescante banho de luz, seguindo bem pelo meio deste rio em que habito com um sorriso nos lábios e no olhar,assim aquecido o coração.

25 maio 2005

UTOPIA

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P.S - fui hoje informada k esta foto é da autoria de Isidro Dias
olharesisidro@portugalmail.pt
Ao autor apresento o meu pedido de desculpas, mas muitas vezes acontece "apanharmos" as fotos já sem indicação de autoria. Creia que não houve intenção maldosa.



UTOPIA


Navego ruas que não existem.
Invento-as
Rasgando ventres silenciosos
Saturados de ruídos inhumanos.
Em pontos de luz cheios de sol,
Rasgo praças e jardins
Onde os velhos não estão mais, sós.

Navego ruas que não existem.
Diluo-me nos sons de viver.
Reintegro-me na luz do arco-íris,
Digo: “Bom dia”, a todos os passantes.
Invento uma cidade para namorar,
Estendo-me ao sol a amar a vida,
no leito da brisa ponho-me a caminhar.


Por TMara

24 maio 2005

A propósito do post de ontem e em torno dos vossos comentários




A propósito do post de ontem e em torno dos vossos comentários sinto necessidade de acrescentar algo:
1- o texto não se refere à designada “condição feminina”, “fadas do lar”, “domésticas” ou designações afins;
2 -não é produto de qualquer estado de espírito pessoal.

Tento retratar a situação de mulheres mentalmente doentes (doença específca) em que, muitas vezes, o 1º sinal/sintoma visível é a total confusão da casa. Na casa.

No estrangeiro já há quem estude esta situação.
Estas mulheres são designadas “recolectoras”.


Ao longo de quase trinta anos de trabalho de terreno encontrei muitas situações como a descrita.
Em que a casa é o 1º “agente” a “falar-nos” da confusão mental em que aquela mulher se encontra. Em que a sua cabeça se encontra.

Desestruturada. Um caos que a ultrapassa, a esmaga e a que se sente impotente de escapar.

Incapaz de pedir ajuda porque se não apercebe de que está doente, marcada pelo ferrete sócio-cultural de dona de casa *(só porque nasceu mulher, independentemente de ser também um agente económico para lá das paredes da casa, no mercado de trabalho. Portanto duplamente rentável.) considera-se um fracasso, uma desarrumada, uma desleixada...

E o conjunto dos pensamentos continua a desestruturá-la, a criar novelos enrodilhados e cheios de nós, alimentados agora não só pela impotência (sentida/ vivida) mas pelo complexo de culpa, de falha na tarefa de por ordem na casa, na vida.

Por norma estas mulheres escondem tão bem o problema que quem convive com elas fora do seu ambiente, não conhece nem tem como o identificar.

Interrogo-me se as leituras que consideraram falar eu de um modelo de mulher (em vias de) extinção, ao fazerem esta leitura não estarão afinal bem infectadas, assombradas, obcecadas na sua rejeição pelo modelo que tem sido dominante nos últimos 3 séculos?

Não afirmo que assim seja!

Como disse atrás interrogo-me e busco compreender o porquê destas interpretações porque por mais que releia o texto não lhe encontro ecos que para aí me conduzam.

Se em vez da palavra “mulher” estivesse escrito “homem”, como o interpretariam?
(POR FAVOR FAÇAM ESTE EXERCÍCIO E DIGAM-ME DE VOSSA JSTIÇA!)
Se tal vos peço é porque busco compreender onde falhou o texto.

Continuando no universo feminino: há muitas situações como a atrás referida; há muitas mulheres com vícios secretos (desde o álcool a outros), tenazmente escondidos do pesado olhar avaliativo da família e do social (próximo) em geral.

Que a "mulher já não é......"cada vez menos mas ainda demais em minha opinião!
Infelizmente optimismo em excesso creio. Tendemos a pensar o mundo à imagem do nosso pequeno universo. Da nossa tribo de pertença...

Para lá das muitas situações com que me tenho defrontado e que são, infelizmente bem reais e actuais vi, há tempos, um documentário sobre a matéria e foi ele que despoletou a necessidade de escrever.

A título de nota de rodapé: obrigada ao

Manoel Carlos
Pelos seus sempre construtivos comentários.
Estou familiarizada com a teoria do caos, mas situações como a que tentei descrever já estão para além de um caos reorganizador se não houver uma intervenção técnica de suporte.

Obrigada a todos pelos contributos que me estimularam, levaram e levam a continuar esta reflexão.
Aos que em mim a personalizaram, deixando palavras de apoio e incentivo o meu bem hajam pela vossa preocupação, errada embora.

* - atentemos que por norma, nos casais, as tarefas domésticas continuam a ser assumidas (por ambos) como pertença do elemento feminino em que os homens "AJUDAM"!

Esta palavra diz tudo. Ajudar quer dizer fazer algo pelo outro, referente a algo que é da sua responsabilidade e não de quem a executa.

23 maio 2005

A mulher e a casa

Na cabeça da mulher a vida corre como um sorvedoiro, turbilhão descontrolado, enchente voraz que tudo arrasa, rio de águas enlouquecidas que esqueceram as margens alagando tudo ao seu alcance, submergindo e destruindo todos os obstáculos que encontram no caminho.

Só que, na cabeça da mulher, os pensamentos são os obstáculos. São derrubados, desestruturados e ficam, estilhaços de arestas cortantes e ferozes, envolvidos na voraz correnteza, vórtices de destruição, ecoando no cérebro em ritmo alucinante e sem nexo.

A mulher sofre imersa num caos mental. A vida cavalo louco em desfilada, atirada a cavaleira ao chão derruba-a e espezinha-a na complexidade a que não consegue por freio, travão, ordem.

A casa que a mulher habita há muito que transbordou. Encheu-a de inúteis coisas, descontroladamente, sem disso se aperceber.
Esmaga-a. Tornou-se opressiva como tudo ao seu redor e, pior, dentro de si.


Isola-se a cada dia, não porque queira, mas porque já nada controla. Nada de seu, nem os pensamentos que tomam forma como que impostos e que a fazem sofrer.

Continua ali. Esmagada sem que ninguém repare, já nem grita por socorro. Não lhe restam energias.
Aos poucos e poucos deixa que o caos progrida. De onde em onde flashes de lucidez dizem-lhe que será melhor assim, que a perda total de consciência das coisas lhe trará paz, uma paz perto da morte, do nada, da indiferença por ausência de luz interior e começa a rebelar-se, mas os pensamentos desencontrados não a deixam seguir esse fio condutor. Submergem-na. Afoga-se eles. Perde-se nos fragmentos cortantes dos fugazes pensamentos que a habitam e lhe soterram o pensar, a força, a vontade, o querer.

A casa nada mais é do que a expressão do interior da sua cabeça. Atulhada, inerte e inútil.

21 maio 2005

Passo.Alargo o passo

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(um sorriso do tamanho do mundo do Musée du Sourir)

Passo. Alargo o passo.
agarro a vida. Solta
como bando em debandada
quando o predador avista.

Lanço-me à torrente, encho
o rio, sou afluente, nasço
no poente e vogo pontos cardeais
inexistentes. Insisto no verbo

onde tudo começou. Semeio o dia.

(por TMara)

20 maio 2005

Apontamentos do meu país de trazer no bolso - I

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Apontamentos do meu país de trazer no bolso
I
1 – As empresas devem milhões e milhões ao estado português. Para não ir mais longe vejamos as duas situações mais badaladas nos últimos tempos:
A empresa Grão-Pará deve 13, 2 milhões ao fisco e à segurança social (o que quer dizer que os descontos efectuados nos salários dos trabalhadores para pagamento à segurança social ficaram retidos como capital da empresa.....).


Não esqueçamos que este montante representa só a ponta do iceberg pois nos entretantos a empresa tem recebido incentivos e apoios estatais (NOSSOS), enquanto orgulhosamente não cumpre, exigindo mais ao estado (de todos nós).
Os clubes de futebol, mau grado as negociações, os planos de pagamento faseado e a afirmação certa (?) de exigência de pagamento feita pelo anterior ministro das finanças (Bagão Félix) viram o pagamento da dívida de 56,7 milhões de euros protelada (mais uma vez) para as calendas gregas, as quais (parece) irão ocorrer em Portugal no ano de 2010....


Se fizermos uma busca exaustiva poderemos ficar boquiabertos e assim permanecer, em estado de total estupefacção, com o total desrespeito das empresas no cumprimento das suas obrigações fiscais enquanto exigem ao estado mais regalias e....as obtêm.
Total destas duas (só duas) dívidas: 69,9 milhões de euros!

2 – O desemprego subiu e continua subindo mais do que avião ao descolar da pista.
7,5%!
Segundo dados do INE (instituto Nacional de Estatística) o nº de desempregados (ou como eles preferem designar: “pessoas sem emprego”) é de 412 mil, das quais 204 mil desempregados de longa duração; 106 mil desempregados há mais de 2 anos (24 meses). Na última situação verificou-se um aumento de 42,9%.
Nos desempregados há mais de um ano o aumento cifra-se nos 17,1%.

3 -Linhas de combate ao défice: na primeira linha, congelamento dos salários da função pública!
E caça ao pequeno devedor! Aquele infeliz que por trabalhar para outrem paga tudo com um palmo (ou mais) de língua de fora....

E eu que pensava que a primeira linha deveria ter como horizonte a cobrança destas mega-dívidas e um plano fiscal que as impeça no futuro, com profundas penalizações.


Por esta e por outras é que nunca chegarei a ministra ou similar.


Bem vistas as coisas, para diminuir o desemprego, vamos apoiar as empresas, principalmente as devedoras, pois são elas que criam a riqueza do país....

19 maio 2005

Como um nenúfar

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Como um nenúfar



Como um nenúfar
afogo-me no ar.
A longa cabeleira
Estende-se. Teia
Entrelaçando estrelas.

Lanço gritos silenciosos
Em busca do mar.

Por: TMara

18 maio 2005

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QUOTIDIANO DE UM CIDADÃO VULGAR

Uma dolorosa consciência
atravessa o dia a dia.
Em cada minuto pensa,
elabora e define estratégias
de sobrevivência.

Por: TMara

17 maio 2005

Difícil me tem sido a gestão do tempo

Difícil me tem sido a gestão do tempo nos últimos dias.
Entre as termas (estão a acabar) e a doença de um elemento do grupo familiar alargado...
Vim, numa corridinha, deixar-vos um olá, semear umas palavras e esboçar sorrisos, entre esta minha casa e as vossas, a que retornarei devidamente e saudosa.

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No passado dia 12, num post em Papoilas que pingam algodão doce>, fomos convidados a escrever um haikai.
Deixo-vos a minha tentativa e a informção (aos que o não souberem) que nesse post encontram links para a técnica do haikai.



Ruído
Nos campos os grilos
esmagados
pela estridente cidade.
(TMara)

14 maio 2005

O saloio em Lisboa

Este texto foi-me oferecido por um amigo.
Fazia parte de uma revista nos idos de 40...
Bom fim-de-semana, com um belo sorriso :)



O SALOIO EM LISBOA


Ena! O que aqui vai de gente!
Z’oira viva a sociedade!
S’o meu olho num me mente
Isto aqui tudo é decente...
...Inté qu’estou à vontade.

(Senta-se, mas levanta-se logo)

Saibam antão Vossorias
Qu’há três dias que m’acho cá na cidade
--na Lisboa...
Tenho palavras singelas
--Quer dezer: ê cá num sê mintir.
A cedade tem “àquelas”
Qu’ê nen as sê construir!

Em certas ruas estrêtas
Volta e meia –é p’ra cismar...
Num vejo sanan sujêtas
Sempre a rir, munto instifêtas...
Todas por mim a chamar! (Bairro Alto)

Indas há pouco chiguê
--Transdantonte—está sabido.
E palavra, nam cuidê
Qu’ era cá tam conhecido !!

Onte fui vê-lo Caimões.
Bem pracido nas fêções
Qu’ê já vi o sê retrato.
Só tem um defêto intêro:
O Caimões era triguêro
Ma nanja assim tan mulato!

Em baixo no Cais Sidré
Vi outra estátula im pé
C’um botas de embarcadiço.
E indas oitra cum bandêra
Tamem da cor da primêra
San negras como um chamiço!
Num percebo estes precêtos,
Num percebo estas históiras
Fazer tanta guerra aos pretos
E prantá-los nas mimoiras!
Vai ospois fui à prescura
Do tal “amor” do Frontão (Município)
Vem a ser uma figura
P’los modos de pedra dura
Vestida ...de Pai Adão!
Dizem qu’aquele diacho
Muita decência num tem.
Ê num sê, mas cá debaixo
Num se vê lá munto bem!

Vai ospois fui àquela...
Nem me pode alembrar o nome dela!
Ah!... À cozinha inconómica, atinê!
Inté uma cachopa toda bela
É que me encaminhou. E é que gostê!
--Com 4 vintens somentes
Fiquê que nem um abade...
Sopas cum pão—incelentes...—
Pão sem sopas, feijão frade...
Lá o vinho é que era pôco...
Mas fiquê todo bacôco
P’rás irmãs da Caredade!!

Oitra aquela, mês Senhores:
Fui vê-los alvadores.
Vão p’ra baixo. Vão p’ra riba,
Às claras, mai-lás escuras...
Mas num vi cavalgaduras ,
Parece coisa do diacho.
E s’aquilo, de repente,
Quebra tudo e tudo cai?
Pode ir neles toda a gente
Nanja o filho de mê Pai...
...lá ser tolo, isso está quente!

Mais fui vê-lo o Alifante
Que tamem é interessante
C’aquela tromba d’estalo...
Z’oira quando eu estava a ver
Toda aquela bicharia,
Veio uma coisa a correr
C’umas vozes de pipia e
Zás—botou-me por terra.
Fiqu~e que nem um cação.
Ó Senhores eu fui à Serra,
Ma nam le pude ter mão

Era um diabo dum animalejo (Bicicleta)
Em riba d’um moinho
Ou que raio é...
A dá-las pernas como um caranguejo
E Zás, catrapáz...
Passou-me o pé!!!
Aquilo foi de carrêra
Parecia que ia a voar!
Assim daquela manêra
Quem no habera d’ agarrar?
Alimpê-ma da poêra
E prantei-me a passear!

P’r’áli estive a ver navios
Talvez maia hora à justa.
Ospois fui ver os fêtios
Do Arco da Rua Augusta!

É obra asseada, bonita!
Cum sê relojo catita
Lá mêmo no meio do centro.
Ma-lo que é munto esquesit
É qu?o relojo maldito
Dá só horas lá pra dentro!

É assim mal acomparado
Como o bandulho da gente...
Sim, quando está esfomeado
Dá horas com’um danado,
E cá fora num se sente!

Dênos que prantê o pé
Nesta esquesita cedade
Somente um “legalé” me enganou
--Lá isso é verdade.
Fez tanta choradêra o menino,
Aquele grandecíssimo intrujão,
Qu’ê tive dó dele até perdê-lo tino
E dê-le seis mel reis por um cordão
--Qu’ele dezia que era d’oiro fino!
--Fino e bem fino foi o malandrão!

Em vistas disto fui fazer quêcha à Polícia...
E é que fui que nem um raio.
Mas disse-me lá um “litarado”
--Vuncê queria ouro de lê
Por dê reis de mel coado?
Vá-s’embora, qu’é bem fêto.
E aguentei-me no baloiço
Quando não via-le gêtos
D’ir bala-lo ó Calaboiço...

E agora, com respêto ós Senhores,
S’ê disse alguma mal dita
Só peço escurpa da dita
E agardeço os sês favores.
S’ê prestar p’r’alguma coisa
Amanhem ou p’ró futuro...
Bonda prescurar em Loisa
O Manel Mendes Maduro !.

12 maio 2005

Revelação (4ª parte)

Revelação (4ª parte)

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Correram, dois dias depois, ao consultório do pedo-psiquiatra, a narrar-lhe as tristes novidades, mas esperançados em que o atraso se devesse a esse funesto hábito e que, uma vez descoberto, pudesse ser tratado e minimizadas as consequências. Desenganou-os médico. Que a deficiência, o retardamento, tinha a ver com a fase de gestação e não com comportamentos adquiridos, ainda que estes em nada a melhorassem.

Ficou ali assente que todas as bebidas alcoólicas passariam a ser fechadas à chave e não mais ficariam expostas num móvel como até à data, pois que assim não tinham sobre elas nenhum controlo e a criança facilmente a elas acedia, consumindo-as se o entendesse.
Nas férias de Verão lá foram, pai, compadres e Maria da Luz, de férias para Benidorm. Na viagem de regresso foram albaroados - mais adequado seria dizer: cilindrados - por um camião, tendo, milagrosamente, sobrevivido Maria da Luz e o pai, José Gomes.

Este ficou numa prostração de espantar. Pois que o não sabiam tão amante esposo. Afinal, a prostração devia-se, por um lado, à perda da esposa e dos amigos (compadres) e, por outro, em grau mais elevado, ao medo da situação. Sem avós, maternos ou paternos, teria que ser ele a desempenhar o papel de pai, de mãe e, inclusive os papéis que os dois padrinhos sempre tinham assumido na vida da criança.

Chorava, mas chorava mais por ele próprio, pelos seus medos, receios e inseguranças, do que pelos falecidos.
Se até ali fora um provedor daquela família, ficando as restantes responsabilidades a cargo da mulher, agora tinha que ser tudo o que fora e muito mais, acrescendo o retardamento da filha, o qual, com o passar dos anos, se acentuava, sendo agora flagrante, tornando-a numa rapariga estranha e até difícil de se gostar pelos hábitos que adquiria e resistência, expressa de forma deselegante raiando a má educação, a qualquer tutela.
N.B - as 3 partes anteriores encontram-se já aqui publicadas

11 maio 2005

No Reino dos Céus - sobre o filme

"No Reino dos Céus" - sobre o filme
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O filme, “No Reino dos Céus”, de Ridley Scott, é mais um filme que vale a pena ver. Diria: que se deve ver.
As deixas das personagens são falas cuidadas e que em alguns (maioritariamente as das personagens centrais) pretendem ser restauradoras de valores que consideramos perdidos. Afinal os valores centrais do humanismo.
Vivemos um tempo sem heróis. Morreram todos não sabemos onde. Talvez quando alguém descobriu que Deus estaria morto.
Um tempo em que os paradigmas dominantes não elevam moral e humanamente, mas tão-somente socialmente. Celebridades, vip’s e afins....!
Um tempo em que precisamos de recriar grandes épicos para restaurar valores e modelos.
E eles aí estão. Com falas que são lições para a vida e que nos deixam a pensar.
Exactamente por isto e muito mais que cada um é capaz de descobrir, vale a pena ver.
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Post scriptum_ peço a toda a gente boa que por aqui passa e deixa simpáticos e por vezes preocupados posts, que me desculpe a ausência de resposta aos mesmos.
Acontece que ando nas termas - vou e venho diariamente - o que me leva quase todo o tempo. O pouco que tenho aproveito para ir entrando em vossas casas e disfrutando dos acepipes que por lá deixam.
Beijo grande e :)

10 maio 2005

Site do Rebordão Navarro

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Esqueci-me:
quem quiser pode dar uma passadinha por um site (ainda incipiente) do escritor António Rebordão Navarro é só clicar aqui, no nome dele!
Encontrará os títulos de toda sua obra e excertos de alguns livros.
Boa viagem....

09 maio 2005

Voltemos a Rebordão Navarro


Voltemos à poesia de António Rebordão Navarro.
Fiquemos, hoje, com:
AS CASAS (SINAIS GRÁFICOS)
Dispostas, cruciformes, sobre o linho,
desbotadas nos peitos e nas costas,
nos pratos,
vírgulas a esmo na paisagem,
urbanas reticências.
Feitas fotografia e problema,
circunspectas, circunflexas, as casas
com persianas, portadas e cortinas,
paroxítonas, reflexas.
Entre flores e aspas,
beliscaduras,
vícios e virtudes
e parêntesis..
Ponto final. Parágrafo.
Seus perfumes,
dois pontos:
a rio e mar, por certo os teus
cabelos,
as tuas mãos também
por onde passam, pousam estas letras.
(in: 27 POEMAS. Porto: Editora justiça e Paz:28)

08 maio 2005

Teste de personalidade

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{Colagem, técnica mista, por TMara}

Para descontrair aqui vos deixo os resultados do meu

TESTE DE PERSONALIDADE





Your #1 Match: INFJ




The Protector

You live your life with integrity, originality, vision, and creativity.
Independent and stubborn, you rarely stray from your vision - no matter what it is.
You are an excellent listener, with almost infinite patience.
You have complex, deep feelings, and you take great care to express them.

You would make a great photographer, alternative medicine guru, or teacher.


Your #2 Match: INTJ




The Scientist

You have a head for ideas - and you are good at improving systems.
Logical and strategic, you prefer for everything in your life to be organized.
You tend to be a bit skeptical. You're both critical of yourself and of others.
Independent and stubborn, you tend to only befriend those who are a lot like you.

You would make an excellent scientist, engineer, or programmer.


Your #3 Match: ENFJ




The Giver

You strive to maintain harmony in relationships, and usually succeed.
Articulate and enthusiastic, you are good at making personal connections.
Sometimes you idealize relationships too much - and end up being let down.
You find the most energy and comfort in social situations ... where you shine.

You would make a good writer, human resources director, or psychologist.






E que tal fazerem o vosso e ver se se aproxima?

07 maio 2005

Necessidade premente

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(foto por : Francisco Pinho)
Necessidade premente
Entrar em cada quarto e partir.
Quebrar os vasos, as jarras, os vidros.
Desmontar as camas e as mesas.
Rasgar os papeis e as memórias.
Fazer uma fogueira, até deixar
arder todo o recheio. Repor as paredes
nuas e vazias, como vazia está
a silenciosa casa que habita.
Povoá-la de pó e estranhos animais.
Deixar a água correr até fazer um rio.
Mergulhar violentamente, para ficar
emudecida e bruta, como pedra,
no fundo. Inútil, como a vida.
Com as unhas rasgar a carne
e puxar as veias, uma a uma.
Compor vermelhas melodias
de um fantástico pôr-do-sol.
Puxar os tendões, os nervos, a força
e atirá-los ao turbilhão do espaço
como molas, ou tensas cordas,
de violino. Esfrangalhar de si,
o vazio corpo e oferecer-se ao cosmo,
num último e inútil abraço.
(por TMara)

05 maio 2005

Crianças do meu país

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Como diz o Eduardo, Marias e Maneis da Luz, há muitos.
Onde pára Joana, a menina Joana, de quem tanto se falou e cada vez mais confusas ficaram as investigações?
Como viveu esta criança? Que vida foi a dela? E a morte? A morte, dado que não acredito que se encontre viva!
E a pequenina Vanessa cujo corpo o pai e a avó, deitaram ontem ao rio Douro, tentando imputar culpas a estranho, ou estranha, por rapto na feira de Gaia, numa tentativa de assim esconderem o seu crime?

Estes crimes, hediondos como todos, mas mais ainda, se assim o podemos dizer, por recaírem em crianças que confiavam e dependiam, para sua própria protecção, dos agressores, nada mais são do que um extremo do cúmulo de sofrimento que as suas pequenas e curtas vidas foram.
Um horror continuado ameaça tomar conta de mim. Ontem ao ir para as termas, parámos, eu e umas amigas, no Mosteiro de Landim.
Uma grande praça/avenida leva-nos até ele. Terreno aberto, sem obstáculos, óptima visibilidade.

Uma mulher subia, com uma criança de talvez cinco anos (deduzo pelo tamanho) pela mão. Vi-as ao longe. Parámos o carro e, por breves minutos, desviámos a atenção, virando-a para o edifício da Junta de Freguesia em que pretendíamos pedir uma informação. Uma de nós foi lá. Aguardámos e vimos a mulher questionando alto na nossa direcção. Olhámos procurando a quem se dirigiria. Não havia mais ninguém em todo aquele terreiro despovoado.
Deitei a cabeça fora da janela e perguntei-lhe se falava connosco.

«A minha filha ficou com vocês?»
Estranha formulação esta, dado que só as havíamos visto ao longe! Caminhando. Mãos dadas.
Nunca a criança estivera perto de nós, quanto mais connosco!
Um arrepio alojou-se em mim, habitou-me.

A mulher estava parada. Mais ou menos no ponto onde as vira de mão dada pela última vez. O descampado continuava aberto, amplo, com boa e total visibilidade.
Joanas, Marias, Carlas, Flávias, Marinas, Luisas.....Manueis, Vanessas...


Quem cuida das crianças do meu país?

04 maio 2005

Revelação (3ª parte)

REVELAÇÃO (3ª parte)
Ficaram, pais e padrinhos, sem palavras. A professora, por seu lado, sentiu um incomensurável alívio, pois apesar da vivacidade dos olhos de Maria da Luz já a si mesma pusera, em muito segredo, tal hipótese. E apesar de serem pensamentos interiores, nunca expressados, pareciam-lhe um sacrilégio pelo que começara, inclusive, a duvidar das suas capacidades de docente. Ora este diagnóstico restituiu-lhe a confiança, a força e a determinação que antes sempre demonstrara como formadora.Comentou monossilábica: “Ahhhh”.Ali ficou acordado, com os técnicos de saúde mental, a necessidade de apoio continuado à criança.Aos 11 anos já os colegas de Maria da Luz frequentavam o ciclo, continuando esta, no mesmo ano, demonstrando, volta e meia, nas atitudes e comportamentos, facetas bizarras e inquietantes que ninguém conseguia compreender. Nem nas sua razões, nem nas expressões que das mesmas fazia.Um dia foram dar com ela, num anexo do quintal, escorripichando o vinho, a aguardente e o whisky, bem como o mais alcoólico que por lá havia, em fundos de garrafas ali deixadas após a festa do décimo quinto aniversário de casamento dos pais.Inquietou-se toda a família, na qual não constava ter, alguma vez, havido tendência para as bebidas alcoólicas. De onde lhe viria esta hábito, se o teria adquirido com alguma das criadas, e se o teria há muito?Perguntas a que ninguém soube responder, nem mesmo Maria da Luz. Que não soube, ou não quis.

{a 2ª parte pode ser lida no post de 20 de Abril}

02 maio 2005

Em favor da Palestina

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Também nós Amamos a vida

Também nós amamos a vida quando podemos.

Dançamos entre dois mártires e no meio
deles erguemos um minarete de violetas
ou uma palmeira.

Também nós amamos a vida quando podemos.

Ao bicho-da-seda roubamos um fio para tecer o
nosso céu e estancar este êxodo.
Abrimos a porta do jardim para que o jasmim saia
Para a rua como um dia bonito.

Também nós amamos a vida quando podemos.

Na morada que escolhemos, cultivamos plantas
Vivazes e recolhemos os mortos.
Sopramos na flauta a cor da distância,
desenhamos um relincho no pó do caminho.
E escrevemos os nossos nomes, pedra a pedra.
Tu, ó raio, ilumina a nossa noite, ilumina-a
um pouco.

Também nós amamos a vida quando podemos.

Poema de Mahmud Darwich

In: EM FAVOR DA PALESTINA, leilão de obras de arte e manuscritos, a realizar na Cooperativa Árvore, dia 16 de Abril de 2005.
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